"Gullar é o último grande poeta brasileiro", Vinícius de Moraes, poeta
"Ferreira Gullar se dispôs a transgredir as fronteiras do sistema da
língua porque nelas não cabiam a fúria e a intensidade daquilo que se
dispôs a expressar", Ivan Junqueira, antecessor de Gullar na cadeira 37
"Gullar é o nosso único poeta maior dos tempos de hoje", Sérgio Buarque de Holanda, historiador.
Por votação quase unânime, a Academia Brasileira
de Letras (ABL) elegeu hoje (9) o poeta Ferreira Gullar para a cadeira
37 da Casa, vazia desde 3 de julho, com a morte do poeta e tradutor Ivan
Junqueira. Gullar recebeu 36 dos 37 possíveis e foi eleito em primeiro
escrutínio. Um voto foi em branco. Votaram 18 acadêmicos presentes e 18
por cartas.
O maranhense Ferreira Gullar, cujo verdadeiro nome é José de Ribamar
Ferreira, nascido em São Luís, em 10 de setembro 1930, é o terceiro
poeta a ocupar sucessivamente a cadeira 37. Antes de Ivan Junqueira, ela
pertenceu ao pernambucano João Cabral de Melo Neto. A cadeira teve como
fundador Silva Ramos, que escolheu como patrono o poeta Tomás Antonio
Gonzaga. Seus ocupantes anteriores foram Alcântara Machado, Getúlio
Vargas e Assis Chateaubriand.
Nascido em uma família de classe média pobre, Gullar passou a
infância entre a escola e a vida de rua, jogando bola e pescando no Rio
Bacanga. Aos 18 anos, começou a frequentar os meios literários da
capital maranhense. Um ano mais tarde descobriu a poesia moderna, ao ler
os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira.
Em 1954, Ferreira Gullar lançou A Luta Corporal, livro que o projetou
no cenário literário nacional. Os últimos poemas deste livro
provocariam o surgimento, na literatura brasileira, da “poesia
concreta”, da qual ele foi um dos participantes. Dissidente, passou a
integrar um grupo de artistas plásticos e poetas do Rio de Janeiro,
denominado neoconcreto.
São expressões da arte neoconcreta as obras de Lygia Clark e Hélio
Oiticica, hoje nomes mundialmente conhecidos. Nesse grupo, Gullar levou
suas experiências poéticas ao limite da expressão, criando o
livro-poema, o poema espacial e, finalmente, o poema enterrado.
O último é uma sala de subsolo, a que se tem acesso por uma escada.
Após penetrar no poema, o visitante se depara com um cubo vermelho. Ao
levantar o cubo, encontra outro, verde, e sob este ainda outro, branco,
que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.
Após afastar-se do movimento neoconcreto, Gullar aderiu à luta
política revolucionária, nos anos que antecederam e que se seguiram ao
golpe militar de 1964. Membro do Partido Comunista Brasileiro, foi
processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve de abandonar a vida
legal. Passou à clandestinidade e, depois, ao exílio.
Durante o exílio em Buenos Aires, escreveu Poema Sujo, poema de quase
100 páginas, avaliado como sua principal obra. Traduzido e publicado em
várias línguas e países, Poema Sujo foi determinante para a volta do
poeta ao Brasil.
Quando retornou, em 1977, foi preso e torturado. Libertado por
pressão internacional, retomou seu trabalho na imprensa do Rio de
Janeiro e, como roteirista, na televisão.
O teatro é outro campo de atuação de Ferreira Gullar. Após o golpe
militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro
Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime
autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Vianna Filho, as
peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica
a saída? . De volta do exílio, escreveu Um rubi no umbigo, montada pelo
Teatro Casa Grande, em 1978.
Em 2002, Ferreira Gullar foi indicado para o Prêmio Nobel de
Literatura. Em 2010, recebeu o Prêmio Camões, o mais importante para
autores de língua portuguesa. Instituído em 1988 pelos governos do
Brasil e de Portugal, o Camões é concedido anualmente a autores que
tenham contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e
cultural do idioma.
Paulo Virgílio - Repórter da Agência Brasil